Inovação e cooperativismo reinventando as comunidades do Rio de Janeiro

O cooperativismo sempre alcançou regiões que ninguém mais chegou, enxergando ali um potencial de desenvolvimento único. E foi fazendo jus a esse legado que o Estado do Rio de Janeiro tem dado mais atenção para suas comunidades e favelas e as transformando em grande impulsionadores socieconomicos através do cooperativismo de plataforma.

Essas iniciativas foram destaque no Hakcing.Rio 2020, maior maratona de inovação da América Latina relacionada à educação e cultura digital, em que os participantes “hackathoners” tiveram o desafio de criar novas formas de integração entre os moradores da comunidade da Rocinha oferecendo oportunidades de troca, venda de produtos e serviços e até uma moeda digital local, que permitirá um aumento de empregabilidade, geração de renda e desenvolvimento local sustentável. O cooperativismo de plataforma na prática!

Para entender mais sobre esses projetos, o sucesso do evento e a importância de fomentar o cooperativismo de plataforma no país, a MundoCoop conversou, com exclusividade, com o Superintendente do Sistema OCB/Sescoop do Rio de Janeiro, Abdul Nasser.

Confira!

1 – O cooperativismo sempre foi um movimento incentivador de projetos que estimulam o desenvolvimento das comunidades. Como funcionam as iniciativas do Coop Mais Favela e do Coopera Favela? Por que elas ganharam destaque?

Na verdade, nós estamos trabalhando para desenvolver áreas de tecnologia e de cooperativas de plataforma aqui no Rio e patrocinando alguns eventos para inserir o cooperativismo de plataforma. Esse ano, até devido à situação de pandemia, fizemos um levantamento do potencial econômico das comunidades e lançamos como desafio único do Hacking Rio, no nosso cluster, o Coopera Mais Favela.

A ideia desse projeto era criar soluções que permitissem a conexão das pessoas em comunidades para que elas comercializassem produtos e serviços ali mesmo, fazendo com que o dinheiro fique na localidade através de uma cooperativa de plataforma ou de uma plataforma baseada no cooperativismo.

E disso nasceu o Coopera Favela, que é um dos projetos. Tivemos 35 grupos de hackers inscritos para desenvolver atividades e o Coopera Favela foi o grupo vencedor. Eles ganharam porque conseguiram conectar todas as áreas da favela e ainda trabalharam com uma ideia de moeda digital, entregando um produto viável. Agora, nós estamos investindo no desenvolvimento pós evento com treinamentos, preparação e conexões para que eles realizem efetivamente aquilo que se propuseram.

2- O que foi ou será preciso para que essas iniciativas saiam do papel? Quais são as expectativas de impacto e retorno?

O cooperativismo e plataforma tem um potencial incrível, mas ele é diferente de uma startup e tem uma dificuldade um pouco maior. Criar e fazer sair do papel é um pouquinho mais difícil porque, na verdade, depende do convencimento daqueles que vão participar do investimento do próprio interessado. Mas a gente tem buscado o apoio de empresas B, definindo ali algumas estratégias de captação de recursos próprias e adequadas ao cooperativismo, inclusive recursos públicos, onde preparamos alguns pedidos de emenda parlamentar para ver se conseguem apoiar o projeto e tirar do papel.

Nosso objetivo é fazer nascer essas cooperativas, é fazer nascer esses negócios.”

6% da população brasileira vive em favelas e só nas favelas do Rio de Janeiro nós temos uma economia movimentada que passa dos 120 bilhões de reais. Se fizermos com que os negócios se conectem, as pessoas se conectem e esse dinheiro fique na própria comunidade gerando mais trabalho, gerando mais renda e gerando mais economia, vamos conseguir mudar a realidade das pessoas.

3- As comunidades periféricas são regiões muito populosas e com grande potencial, mas que muitas vezes não recebem a devida atenção. Quais são os principais objetivos e desafios ao escolher implementar projetos nessas localidades?

Só as favelas do Rio formam um mercado efervescente, um mercado gigante e bilionário que pode de fato ser potencializado e muito. Existem localizações, no caso do Rio de Janeiro, estratégicas para inúmeros pequenos negócios porque estão do lado, por exemplo, da parte mais rica da cidade. Enfim, acreditamos que fazendo com que os negócios se organizem em cooperativas, conectando as pessoas e levando empreendedorismo cooperativo para essas comunidades, esses recursos poderão ficar ali e fazer com que as pessoas mudem sua visão em relação à favela.

A favela se tornará uma grande área de empreendedorismo, de empreendimento cooperativo.

Os objetivos do nosso desafio eram justamente criar essa ferramenta e democratizar o acesso aos moradores de comunidades de todo o Brasil, mas principalmente no Rio, aos benefícios que o cooperativismo plataforma pode ofertar.

4- Projetos como esses foram reconhecidos no Hacking Rio desse ano, que contou com patrocínio do Sistema OCB/RJ. Qual a importância do cooperativismo se aproximar de eventos como esse? Qual o benefício de unir ações de fomento à inovação com o movimento cooperativista?

Esse é nosso terceiro Hackathon e é recorde atrás de recorde. Foi o maior Hackathon da América Latina, sendo o primeiro mega Hackaton a ter o cooperativismo de plataforma como tema, o primeiro do mundo.

Esses eventos levaram o cooperativismo para cabeça de mais de 3 mil hackers e isso faz toda diferença naquilo que queremos construir, que é um Rio mais Coop, é o cooperativismo mais forte no Estado do Rio de Janeiro e no Brasil.

A nossa intenção, quando decidimos investir no Hacking.Rio era divulgar o cooperativismo como um modelo de negócio para os empreendedores digitais. E deu muito certo porque no primeiro Hacking.Rio tivemos três equipes captadas a laço e agora tivemos o maior cluster, com 37 equipes.

E o que isso quer dizer? Os Hackers vêm, tem vários temas e eles acabam se aglomerando nos temas que são mais confortáveis. Do primeiro para o segundo Hacking.Rio o que tivemos foi um crescimento exponencial do número de hackers que se interessaram em montar uma equipe para atender os desafios do cooperativismo. Então, nosso objetivo, enquanto instituição que fomenta o cooperativismo no Estado, foi atingido.

Queríamos que, mais do que ter um projeto que de fato que gerasse resultado nos primeiros momentos, que pessoas do setor digital, que jovens empreendedores digitais tivessem no seu portfólio de possibilidades o cooperativismo de plataforma e isso alcançamos brilhantemente.

E esse ano, mais do que isso, o nosso projeto foi o grande vencedor da maratona toda. Foi o maior vencedor do Hacking.Rio e está sendo um projeto incrível. O pessoal da equipe está trabalhando muito para poder continuar o desenvolvimento. Vai ser uma coisa legal disso!

5- A tecnologia vem sendo uma grande aliada da sociedade, principalmente nos dias de hoje. Como garantir que esses projetos sejam acessíveis nas comunidades que não tem tanto contato com essas inovações? Qual o papel do cooperativismo de plataforma nesse contexto? 

Na verdade, o mundo mudou e, com a pandemia, as coisas se aceleraram muito. A transformação digital chegou a todos os cantos de todas as idades, isso é um fato inquestionável e não haverá retorno. Todos os setores precisam avançar.

Agora, é importante registrar que alguns setores podem e devem se organizar por meio de cooperativa porque nem todos têm aquele perfil de empreendedor. As comunidades, por exemplo, só vão conseguir ficar no negócio digital se estiverem juntas enquanto comunidade e o único modelo que permite isso de uma maneira meritocrática não violenta, porque é uma meritocracia que coloca todos nas mesmas possibilidades e nas mesmas oportunidades, é o cooperativismo.

O cooperativismo de plataforma está aí para poder se apresentar como uma das grandes alternativas para a inclusão digital empreendedora das classes mais pobres e também daqueles setores menos organizados tecnologicamente, como o comércio local.”

O cooperativismo entrega na mão de consumidores ou de trabalhadores ou de fornecedores as etapas seguintes da cadeia de negócio e reduz o excesso de intermediação. Então, o cooperativismo de plataforma vem para fazer isso no digital e eu acho que, em poucos anos, vai ser um dos setores mais fortes do cooperativismo brasileiro e mundial.

6- O comércio local é um grande impulsionador das comunidades. Você acredita que as cooperativas têm um importante papel no giro econômico dessas regiões? Como essas iniciativas digitais buscam alinhar toda a logística envolvida nas comunidades? 

Um dos grandes diferenciais do projeto que lançamos, e também do grupo vencedor, é que transforma cada um dos moradores em um entregador em potencial dentro daquelas comunidades. E isso pode ser replicado para bairros que não sejam necessariamente comunidades ou para cidades pequenas.

O modelo é um modelo interessantíssimo e que fomenta o negócio local, mas com possibilidade de conexão nacional e até internacional. Então, gerando essas oportunidades de trabalho e renda, cuidando da logística, transformando as pessoas em agentes logísticos e, principalmente, abrindo a democratização do acesso ao mercado digital para pessoas que hoje não têm essa condição, os potenciais são incríveis!

Acreditamos que em breve o cooperativismo de plataforma vai se estabelecer como um dos setores mais pujantes do cooperativismo mundial.

Esperamos que o Rio de Janeiro tenha esse salto nesse setor e que a gente possa fazer um Rio mais coop e transformar a realidade do nosso Estado através desse cooperativismo.

Fonte: MundoCoop

Bruno Oliveira

Bruno Oliveira

Analista de Comunicação do Sistema OCB/RJ. Formado em Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo. Pós-graduado em Jornalismo Esportivo e Negócios do Esporte, MBA em Marketing e Comunicação Empresarial e em Comunicação e Marketing em Mídias Digitais.

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