Parecer Técnico relativo à Contribuição Previdenciária para sócios de cooperativas do Ramo Transporte

*Por Paulo Campos

CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA – SÓCIOS DE COOPERATIVAS DE TRANSPORTE

Visando trazer esclarecimentos às cooperativas de transporte de cargas, em geral, objetiva-se:
As sociedades cooperativas, administrativa e tecnicamente, são enquadradas em sete (7) ramos de produção e serviços por deliberação da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) .

A Lei 12.690/2012 define e regula as cooperativas de trabalho, excluindo desse âmbito cooperativas que atuam em outros ramos:

Art. 1º A Cooperativa de Trabalho é regulada por esta Lei e, no que com ela não colidir, pelas Leis nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971, e 10.406, de 10 de janeiro de 2002 -Código Civil.

Parágrafo único. Estão excluídas do âmbito desta Lei:

II – as cooperativas que atuam no setor de transporte regulamentado pelo poder público e que detenham, por si ou por seus sócios, a qualquer título, os meios de trabalho;

Art. 2º Considera-se Cooperativa de Trabalho a sociedade constituída por trabalhadores para o exercício de suas atividades laborativas ou profissionais com proveito comum, autonomia e autogestão para obterem melhor qualificação, renda, situação socioeconômica e condições gerais de trabalho.

Consequentemente, frente ao dispositivo legal, as cooperativas de transporte de cargas e de passageiros estão excluídas do rol das cooperativas de trabalho, por não estarem qualificadas com especificidade por um lado e, por outro, pela exclusão impositiva da própria lei.

O Poder Público, através da Agência Nacional de Transportes Terrestres, regula as atividades das cooperativas de transporte de cargas e passageiros, com exigências técnicas específicas a partir do próprio registro das cooperativas junto ao sistema nacional de Registro Nacional dos Transportadores Rodoviários de Cargas (RNTRC), para as de cargas, através da Resolução ANTT nº 4.799/2015 e, para as de passageiros, através da Resolução ANTT nº 4.770/2015, incluindo-se mais toda uma vasta estrutura normativo-técnica e instrumental emanada pela agência, o que, de pronto, qualifica e segrega as cooperativas de transporte das demais.

A Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), através de dispositivos de informações e orientações técnicas publicados para as cooperativas, aparta e consubstancia o ramo do transporte cooperativo de cargas e de passageiros delimitando uma estrutura informacional voltada especificamente às operações, às obrigações tributárias e contábeis das cooperativas de transporte, em plena harmonia com a legislação e com as demais normas exaradas pelo Poder Público para qualificação do ramo.

Tem-se, assim, o reconhecimento formal pacificado da identidade constitutiva, técnica e legal das cooperativas de transporte de cargas e de passageiros, totalmente apartada das cooperativas de trabalho ou das que pertencem aos demais ramos.

Por todo o exposto, as cooperativas de transporte não podem ser confundidas ou agrupadas em nenhum conjunto com as demais, independentemente de qualquer critério, e de forma muito especial quando se tratar das relações jurídico-tributárias dessas sociedades, entre outros campos, sem que, antes, aprecie-se cada tema com apuro e conveniência jurídica adequados e exigíveis.

Avançando sobre o campo previdenciário, identifica-se junto ao art. 4º da Lei nº 10.666, de 08 de maio de 2003, a obrigação das cooperativas de trabalho em descontar, reter e recolher a contribuição social previdenciária devida ao INSS correspondente à remuneração paga ou devida aos contribuintes individuais que lhe prestem serviço e sobre a produção dos seus sócios.

Art. 4o Fica a empresa obrigada a arrecadar a contribuição do segurado contribuinte individual a seu serviço, descontando-a da respectiva remuneração, e a recolher o valor arrecadado juntamente com a contribuição a seu cargo até o dia 20 (vinte) do mês seguinte ao da competência, ou até o dia útil imediatamente anterior se não houver expediente bancário naquele dia.

§ 1o As cooperativas de trabalho arrecadarão a contribuição social dos seus associados como contribuinte individual e recolherão o valor arrecadado até o dia 20 (vinte) do mês subsequente ao de competência a que se referir, ou até o dia útil imediatamente anterior se não houver expediente bancário naquele dia.

Para fins de cumprimento do art. 4º da Lei 10.666/2003, acima, tem-se a equiparação das sociedades cooperativas a empresas em geral, conforme regula a Instrução Normativa da Receita Federal do Brasil nº 971, de 13 de maio de 2009:

Art. 3º – (…)

§ 4º Equipara-se a empresa para fins de cumprimento de obrigações previdenciárias:

II – a cooperativa, conforme definida no art. 208 desta Instrução Normativa e nos arts. 1.093 a 1096 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil);

A mesma IN RFB 971/2009 tipifica as cooperativas de trabalho:

Art. 208. Cooperativa, urbana ou rural, é a sociedade de pessoas, sem fins lucrativos, com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeita a falência, constituída para prestar serviços a seus associados na forma da Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971.

Art. 209. Cooperativa de trabalho, espécie de cooperativa também denominada cooperativa de mão-de-obra, é a sociedade formada por operários, artífices, ou pessoas da mesma profissão ou ofício ou de vários ofícios de uma mesma classe, que, na qualidade de associados, prestam serviços a terceiros por seu intermédio.

Parágrafo único. A cooperativa de trabalho intermedeia a prestação de serviços de seus cooperados, expressos em forma de tarefa, obra ou serviço, com os seus contratantes, pessoas físicas ou jurídicas, não produzindo bens ou serviços próprios.

Ainda no mesmo dispositivo, vê-se o reforço da qualificação das cooperativas de trabalho, no tocante a obrigações principais e acessórias específicas:

Art. 216. As cooperativas de trabalho e de produção são equiparadas às empresas em geral, ficando sujeitas ao cumprimento das obrigações acessórias previstas no art. 47 e às obrigações principais previstas nos arts. 72 e 78, em relação: (…)

Mais, a Receita Federal, no mesmo instrumento normativo em análise (IN RFB 971/2009), conceitua a figura do sócio de cooperativa (cooperado) e aponta seu enquadramentopara fins de contribuição previdenciária:

Art. 212. Considera-se cooperado o trabalhador associado à cooperativa, que adere aos propósitos sociais e preenche as condições estabelecidas no estatuto dessa cooperativa.

Parágrafo único. O cooperado, definido no caput, é enquadrado no RGPS como segurado obrigatório na categoria de contribuinte individual.

A IN RFB 971/2009 também regulamenta a retenção e recolhimento ao sistema “S” (SEST/SENAT) da contribuição devida pelos cooperados na condição de transportadores autônomos, em cumprimento ao que dispõe a Lei nº 8.706, de 14 de setembro de 1993, em seu artigo 7º:

Art. 216 (…)

§ 2º A cooperativa de trabalho, na atividade de transporte, em relação à remuneração paga ou creditada a segurado contribuinte individual que lhe presta serviços e a cooperado pelos serviços prestados com sua intermediação, deve reter e recolher a contribuição do segurado transportador autônomo destinada ao Sest e ao Senat, observados os prazos previstos nos arts. 80 e 83.

Essa imposição da IN RFB nº 971/2009 é mais um apontamento da norma que segrega objetivamente as cooperativas de transporte das de trabalho, pois especifica a obrigação às segundas, uma vez que a Lei 8.706/1993 atinge diretamente as primeiras, além do que a norma em pauta pontua:

Art. 65 (…)

§ 5º O condutor autônomo de veículo rodoviário (inclusive o taxista), o auxiliar de condutor autônomo e o cooperado filiado à cooperativa de transportadores autônomos estão sujeitos ao pagamento da contribuição para o Serviço Social do Transporte (Sest) e para o Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (Senat), conforme disposto no art. 111-I.

Portanto, a Receita Federal do Brasil reconhece e evidencia plenamente junto aos dispositivos regulatórios que exara, aqui, destacados, que as cooperativas de transporte de cargas e de passageiros não se confundem em termos de sujeição passiva na relação jurídico-tributária para com o Estado com cooperativas de trabalho ou outras dos demais ramos.

Seguindo, tem-se na Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, que a base de cálculo da contribuição social previdenciária do transportador autônomo, sócio de cooperativa de transporte é o salário-de-contribuição, o qual corresponde a vinte por cento (20%) do valor bruto auferido pelo frete, carreto ou transporte , vedada deduções correspondentes a gastos com combustível ou com manutenção de veículo:

Art. 28 (…)

§ 11. Considera-se remuneração do contribuinte individual que trabalha como condutor autônomo de veículo rodoviário, como auxiliar de condutor autônomo de veículo rodoviário, em automóvel cedido em regime de colaboração, nos termos da Lei nº 6.094, de 30 de agosto de 1974, como operador de trator, máquina de terraplenagem, colheitadeira e assemelhados, o montante correspondente a 20% (vinte por cento) do valor bruto do frete, carreto, transporte de passageiros ou do serviço prestado, observado o limite máximo a que se refere o § 5o.
O Regulamento da Previdência Social (Decreto nº 3.048, de 06 de maio de 1999) impõe:

Art. 214 (…)

§ 19. O salário de contribuição do condutor autônomo de veículo rodoviário, inclusive o taxista e o motorista de transporte remunerado privado individual de passageiros, do auxiliar de condutor autônomo e do operador de trator, máquina de terraplanagem, colheitadeira e assemelhados, sem vínculo empregatício, a que se referem os incisos I e II do § 15 do art. 9º, e do cooperado filiado a cooperativa de transportadores autônomos corresponde a vinte por cento do valor bruto auferido pelo frete, carreto ou transporte e não se admite a dedução de qualquer valor relativo aos dispêndios com combustível e manutenção do veículo.

A Receita Federal do Brasil, através da IN RFB 9.781/2009, de forma harmoniosa, regula o tema, ratificando no âmbito administrativo o que impõe o Regulamento da Previdência Social:
Art. 55 (…)

§ 2º O salário-de-contribuição do condutor autônomo de veículo rodoviário (inclusive o taxista), do auxiliar de condutor autônomo, do operador de trator, máquina de terraplenagem, colheitadeira e assemelhados, sem vínculo empregatício, do motorista que atua no transporte de passageiros por meio de aplicativo de transporte, e do cooperado filiado a cooperativa de transportadores autônomos, corresponde a 20% (vinte por cento) do valor bruto auferido pelo frete, carreto, transporte, conforme estabelece o § 4º do art. 201 do Decreto nº 3.048, de 6 de maio de 1999 – Regulamento da Previdência Social, observado o limite máximo a que se refere o § 2º do art. 54, vedada a dedução de valores gastos com combustível ou manutenção do veículo, ainda que discriminados no documento correspondente.

Fica, assim, sedimentado o entendimento de que o salário-de-contribuição do transportador autônomo sócio de cooperativa de transporte corresponde a vinte por cento (20%) do valor bruto auferido por ele nos serviços de transporte que prestar.

A alíquota para o cálculo da contribuição previdenciária de sócio de cooperativa de trabalho é de vinte por cento (20%) sobre o salário-de-contribuição, observados os limites mínimo e máximo , segundo consta no Ato Declaratório Interpretativo da Receita Federal do Brasil nº 05, de 25 de maio de 2015.

Art. 1º A alíquota da contribuição previdenciária devida pelo contribuinte individual que presta serviço a empresa ou a pessoa física por intermédio de cooperativa de trabalho é de 20% (vinte por cento) sobre o salário de contribuição definido pelo inciso III ou sobre a remuneração apurada na forma prevista no § 11, ambos do art. 28 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.

A Receita Federal do Brasil, em Solução de Consulta COSIT nº 316, de 23 de dezembro de 2019, conclui que:
Diante do exposto, soluciona-se a presente consulta, informando que a cooperativa de transporte que atua no setor de transporte regulamentado pelo poder público e possui associados pessoas físicas e jurídicas, por não ser uma cooperativa de trabalho, não se sujeita ao ADI RFB nº 5, de 2015 e, como tal, deve reter dos seus cooperados, segurados contribuintes individuais pessoas físicas, a contribuição previdenciária apurada por meio da alíquota de 11% sobre o valor do salário-de-contribuição por eles recebido.

Contudo, no caso concreto consultado, a Receita Federal ressalta que a conclusão se dá em razão da precariedade dos dados apresentados pela própria consulente, o que comprometeu os níveis de segurança para caracterizar e reconhecer se os sócios da entidade são, de fato e de direito, transportadores autônomos ou contribuintes individuais.

Com isso, restou prejudicada a cooperativa que, na prática, fica orientada a aplicar a alíquota de 11% sobre o total da remuneração de seus sócios, caso sejam considerados contribuintes individuais perante o ente arrecadador, como se vê, assim:

Os sócios enquadrados como transportadores autônomos teriam a base de cálculo (salário-de-contribuição) reduzida a 20% do total auferido pelos serviços prestados. Sobre a base reduzida, incidiria o tributo à alíquota de cálculo de 20%, o que, na prática, representa o total de 4% sobre o total de ganhos auferidos no período.

Como contribuintes individuais, os cooperados tem reconhecido o salário-de-contribuição como o total dos ganhos do período pelos serviços prestados e, sobre ele, a incidência de 11% como alíquota de cálculo do tributo.
Isso dá uma diferença real de 7% em desfavor dos cooperados da consulente.

Portanto, conclui-se esta análise apontando como de extrema relevância o fato de que as cooperativas de transporte devem priorizar e garantir o devido enquadramento de seus sócios na condição de transportadores autônomos, adotando, para tanto, todas as medidas de cunho operacional, administrativo e societário a fim de que os efeitos tributários decorrentes das relações de trabalho entre eles e as respectivas sociedades sejam os mais adequados e melhores para todos.

Entre os pontos críticos, como exemplos, está a necessidade da execução formal do ato associativo e o reconhecimento jurídico-formal da propriedade ou posse legitima do veículo pelo cooperado, para que se caracterize a relação societária devida e o correspondente enquadramento dos sócios como transportadores autônomos.

Rio de Janeiro, RS, 19 de maio de 2021.

* Paulo Campos – Contador (CRC-RS: 099.268) – MESTRE em Psicanálise pela FAETES-São Paulo; MESTRE em Educação pelo UNILASALLE-Canoas; Especialista em Administração de Empresas pela ULBRA-Gravataí; Especialista em Gestão de Cooperativismo pela UNISINOS-São Leopoldo; Graduado em Ciências Contábeis pela UNIP; Graduado em Pedagogia com habilitação em Orientação Educacional e magistério em Psicologia da Educação, Sociologia da Educação e Filosofia da Educação pela Faculdade N. Sra. Imaculada Conceição – FAFIMC; Graduando em Direito pela UNIRITTER; Consultor e Educador Empresarial com ênfase em Elaboração e Avaliação de Projetos, Contabilidade de Cooperativas dos ramos Transporte, Saúde, Trabalho e Produção de Bens e Serviços. Professor do Curso de Graduação e Pós-Graduação em Administração e Educação. Pesquisador nas áreas de Administração, Contabilidade e Cooperativismo. Empresário Contábil. Responsável Técnico em Transporte Cooperativo de Cargas.

Bruno Oliveira

Bruno Oliveira

Analista de Comunicação do Sistema OCB/RJ. Formado em Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo. Pós-graduado em Jornalismo Esportivo e Negócios do Esporte, MBA em Marketing e Comunicação Empresarial e em Comunicação e Marketing em Mídias Digitais.

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