Mercado de carbono é oportunidade para cooperativas

Os desafios e as oportunidades para as cooperativas no mercado de carbono foram tema da webinar “Mercado de Carbono: Cooperativas Rumo à Descarbonização”, realizado pelo Sistema OCB. O evento foi aberto pelo presidente, Marcio Lopes de Freitas, e acompanhado por mais de 350 pessoas de todo o Brasil.

Freitas destacou o momento especial atual. “Mais do que a discussão no Congresso Nacional, a legislação e o marco regulatório, vai acontecer a COP 30 [30ª edição da Conferência das Partes sobre as Mudanças Climáticas das Nações Unidas, que será realizada em Belém do Pará em novembro de 2025]. Eu vejo como grande oportunidade para fincar as estacas do cooperativismo, mostrar o que somos capazes e construir consenso”, pontuou.

Para Freitas, “a Organização das Nações Unidas (ONU) também acredita nisso pois declarou 2025 como o Ano Internacional das Cooperativas, mérito das cooperativas que têm mostrado a capacidade de fazer a diferença”. E acrescentou: “vamos fazer uma agenda positiva e chegar na COP 30 mostrando, pelo menos, uma parte de todo o trabalho que as cooperativas fazem e mostrar que podem fazer ainda mais”.

O presidente da OCB saudou e agradeceu o deputado federal Arnaldo Jardim, presidente da Frente Parlamentar do Cooperativismo (Frencoop), presente ao evento, ressaltando a relevância da atuação do parlamentar à frente das causas do setor. “Jardim não é só o presidente da Frencoop e o vice da FPA [Frente Parlamentar da Agropecuária], mas foi destacado como o melhor parlamentar de 2024, o que mais entregou resultados”.

Cooperativismo sai na frente

“Esse segmento é um orgulho para todos nós. É uma nova forma de produzir e de consumir e o cooperativismo sai na frente”, declarou Jardim. Ele lembrou a atuação no Legislativo para tirar o agro do mercado regulado e compulsório de carbono e deixá-lo no voluntário. “Isso não quer dizer que o agro não tem compromisso com a sustentabilidade, não aceitamos essa narrativa”, frisou. Para ele, “ninguém tem uma legislação tão rigorosa, ninguém usa tanto bioinsumos, plantio direto, Integração Lavoura-Pecuária-Floresta, cuida do solo e preserva as nascentes como o agro brasileiro”.

Jardim explicou que o empenho para tirar o agro do mercado regulado e compulsório de carbono deve-se ao fato de ainda não existir uma metodologia clara estabelecida no país.  “O agro tem atividades sequestradora de carbono, nosso saldo de pegada de carbono é positivo. Estamos fazendo um esforço para, estando no mercado voluntário, com o apoio da Embrapa, fazer com que possamos avançar nisso”, disse.

Regulamentação

Os palestrantes da webinar destacaram que as atenções no momento se voltam para a regulamentação do mercado de carbono. “A regulamentação é muito importante. O mercado regulado ainda não está em funcionamento, foram estabelecidos prazos e deve-se levar de cinco a seis anos para estar em plena implementação”, observou Leonardo Papp, advogado e professor de Direito Ambiental.

Papp observou que a operacionalização depende do Poder Executivo e que há um longo caminho ainda a percorrer. “A Lei 15042 [de 11/12/24, que estabeleceu as bases para o mercado regulado de carbono] também tratou do mercado voluntário. A legislação reconhece e dá mais credibilidade, passando a determinar quais sistemas podem gerar créditos de carbono”, observou, acrescentando que as cooperativas de produtores rurais podem gerar créditos que podem ser adquiridos por empresas.

O advogado explicou as especificidades do mercado de carbono. “Não existe um único mercado. São, pelo menos, três: o regulado na convenção do clima, na ONU, que estabelece que quem emitir menos pode gerar crédito (ainda não temos todo o conjunto de regras); o regulado no âmbito nacional ou regional, que é imposto por lei, vários países têm leis impondo metas de emissões e no Brasil passamos a ter com a lei 15042, criando o mercado regulado; e o mercado voluntário, no qual a meta não é estabelecida por imposição legal, mas é auto imposta, funciona para além dos governos, se estabelece de maneira privada. Em paralelo certifica que gera crédito de carbono”.

Repertório de boas práticas

Professor de Direito na Fundação Getúlio Vargas (FGV) e consultor do Sistema OCB para a COP, Daniel Vargas, falou sobre os desafios e oportunidades para o agro e o cooperativismo brasileiros.  “Temos aqui um repertório de boas práticas, de iniciativas concretos que geram benefício, mas que ainda não têm reconhecimento no mercado. A grande questão é se seremos capazes de fazer com que sejam reconhecidas essas virtudes ímpares do agro e da produção brasileira para trazer o que damos de graça ao mundo para a economia. É preciso olhar para o meio ambiente como crédito, como ativo. A grande tarefa que vejo é as cooperativas, o agro, as lideranças públicas e privadas tendo que abraçar a partir de agora essa causa”, declarou. “É uma tarefa ímpar: mostrar ao Brasil e ao mundo que é possível conciliar o desenvolvimento econômico com compromissos socioambientais”.

Daniel Vargas reforçou o papel do setor cooperativista nesse processo: “As cooperativas têm papel decisivo no sucesso ou no fracasso do mercado de carbono brasileiro. Ainda é um mercado boutique, em que pouquíssimos conseguem participar. É caro, burocrático e demorado. A maneira que temos para democratizar é criando sistema. Se as cooperativas fizerem isso poderão não apenas criar mecanismo, mas criar boa quantidade de crédito e também estímulo para olharem para o meio ambiente não como ameaça e custo, mas como oportunidade. Tudo isso dependerá de como vamos regulamentar esse emaranhado de regras, cuja construção começa agora”, enfatizou.

Exemplo das cooperativas

Na webinar, foram apresentadas algumas experiências bem sucedidas de cooperativas que já avançaram no mercado de carbono. Aline Simões, especialista em Sustentabilidade do Sicredi Federação, apresentou o trabalho iniciado em 2019 com o primeiro inventário sistêmico de todas as cooperativas integradas à federação. “Foram estabelecidos sistemas para contabilização de emissões e trabalhada muito a questão da educação para engajar as pessoas”, observou.

Ela contou que, em 2020, o Sicredi aderiu ao programa Brasileiro GHG Protocol. “Foi aprovado pelo Conselho e todas as cooperativas aderiram. “A primeira neutralização foi um projeto na Amazônia. Todas as emissões foram calculadas e compensadas com a compra desse projeto de crédito de carbono”, informou. E, dessa forma, segundo a especialista, o Sicredi segue apoiando projetos sociais e ambientais que contribuam para os ODS [Objetivos de Desenvolvimento Sustentável], estabelecidos pela ONU.

Outro exemplo apresentado foi da Cooperativa Coopercitrus, que atua nos estados de São Paulo, Goiás e Mato Grosso com 40 mil cooperados dedicados ao cultivo de cana de açúcar, café, citros e à produção pecuária, entre outras, além de estar também no mercado de máquinas e implementos agrícolas e insumos.  “Nossa principal fonte de emissão é a frota pesada de caminhões”, informou Bóris Wiazouwski, head de Sustentabilidade da cooperativa. Para reduzir as emissões, a Coopercitrus faz uso da biomassa, usa o etanol para rodar a frota leve e limita a velocidade nos veículos pesados. Além disso, investe na instalação de usinas fotovoltaicas.

Wiazouwski falou também sobre o uso de drones para pulverizar lotes específicos e não mais toda a área, o que também contribui para o aumento da produtividade entre 5% e 7% por evitar o amassamento das plantas que acontece no sistema convencional de pulverização. “Reduzimos em 20% o uso do diesel, restauramos 4 mil hectares de pastagens degradadas, temos 7 mil propriedades com excedente preservado e somos mantenedores de uma fundação voltado à educação para o agronegócio sustentável”, citou como exemplos de outras atuações. E completou: “a descarbonização no agro gera redução de custos, valorização do ativo do produtor e captação de recursos com menos custo”.

A Cooperativa Central dos Produtores Rurais de Minas Gerais (CCPR), quer atua na captação de leite e na produção de rações animais, apresentou as iniciativas que conferiram, em 2023, o selo Prata no GHG Protocol [metodologia internacional que permite a contabilização e a gestão de emissões de gases de efeito estufa]. O presidente da cooperativa, Marcelo Candioto, disse que a intenção para 2025 é obter o selo Ouro do GHG.

Entre as ações desenvolvidas, destacam-se a redução de desperdício, a troca da gasolina pelo etanol e a reciclagem das embalagens plásticas de ração. “Se mudarmos totalmente da gasolina para o etanol, vamos passar de 525 toneladas de emissão de CO2 para 6 toneladas por ano”, comentou Cassio Camargos, gerente de qualidade da CCPR. Para atingir os objetivos, a Cooperativa Central prioriza a intercooperação e incluiu a sustentabilidade em seu planejamento estratégico, incorporando de forma global por todas as áreas da cooperativa, com grupos de trabalhos específicos dedicados ao tema.

“Queremos estar no bioinsumo, na bioeconomia, na biocompetitividade”, destacou o gerente. Para ele, “a sustentabilidade não é uma opção, é a unica escolha para um futuro viável”. E, para reforçar a decisão e a postura da cooperativa em relação ao tema, a sigla ESG [Environmental, Social and Governance] ganhou, na CCPR, uma nova definição internamente: “ESG – Enxergando o Sentido Global”.

Fonte: Somos Cooperativismo/Sistema OCB

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Richard Hollanda

Analista de Comunicação e Tecnologia do Sistema OCB/RJ. Graduado em Jornalismo pela Universidade Veiga de Almeida (UVA) e pós-graduado em Administração em Marketing e Comunicação Empresarial pela UVA.